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Justiça muda entendimento sobre penhora de salário e libera conta de ex-governador

Segunda-feira, 27 Setembro de 2010 - 10:12 | RONDONIAGORA


A possibilidade de penhora de até 30% do salário de pessoas que sofrem execução está sendo repensada pelo Tribunal de Justiça de Rondônia. Juízes e até mesmo desembargadores não tem posição firme sobre o assunto e muitas vezes a decisão acaba prejudicando a vida do cidadão. Mas nesta segunda-feira, uma ação impetrada pelo ex-governador Ângelo Angelin pode colocar um fim ao problema.

Angelin recorreu a Justiça após execução em suas contas pessoais. E provou que parte do que recebe como ex-governador, R$ 6.827,82 foi bloqueado pela 1ª Vara de Execuções Fiscais da Comarca de Porto Velho. No pedido a Justiça, ele afirmou que o dinheiro se encontrava em conta para ser utilizado com o pagamento de suas despesas pessoais e de sua família. O desembargador Walter Waltenberg Silva Junior concordou com os argumentos. "...Entendo que o agravante fez prova de que o valor bloqueado é decorrente de parte dos proventos recebidos a título de pensão como ex-governador do Estado, valor este bloqueado na conta-corrente onde recebe seus proventos. Logo, presente a plausibilidade da alegação". Veja a decisão:


Agravante: Ângelo Angelin
Agravo de Instrumento nrº 0012799-43.2010.8.22.0000
Agravante: Ângelo Angelin
Advogado: Carlos Roberto Vieira de Vasconcelos(OAB/RO 742)
Advogado: Odair Martini(OAB/RO 30B)
Agravado: Estado de Rondônia
Procurador: Luiz Cláudio Vasconcelos Xavier de Carvalho(OAB/RO 1143)
Procurador: Emílio César Abelha Ferraz(OAB/RO 234B)
Procurador: Miguel Gomes de Queiroz(OAB/RO 528A)
Relator:Des. Walter Waltenberg Silva Junior
Vistos.
Trata-se de agravo de instrumento interposto por Angelo Angelin em razão do inconformismo com a decisão interlocutória proferida pelo Juízo da 1ª Vara de Execuções Fiscais da Comarca de Porto Velho, nos autos da execução movida pelo Estado de Rondônia.

Narra o agravante que iniciada a execução fiscal pela Fazenda Pública Estadual, foi requerido e deferido o bloqueio online por meio do sistema BACENJUD. (fl. 10), o qual restou positivo com o bloqueio de R$ 6.827,82. (fl. 13). Afirma que o valor em questão é decorrente de parte da pensão que recebe como ex-governador do Estado, o qual se encontrava em conta para ser utilizado com o pagamento de suas despesas pessoais e de sua família.
Para corroborar suas afirmações, junta extrato bancário em que comprova o recebimento dos proventos na conta onde foi realizado o bloqueio, bem como o contracheque que demonstra ser pensionista do Estado.
Discorre sobre a impossibilidade de penhora de valores recebidos por meio de pensão, bem como da proteção constitucional do salário.

Requer, assim, liminar de suspensão da decisão que determinou o bloqueio online e a imediata liberação dos valores bloqueados. No mérito, requer a confirmação da liminar.

Relatei.
Decido.
Colhe-se dos autos que o agravante é pensionista do Estado de Rondônia e, por decisão judicial, houve bloqueio online em sua conta-corrente no Banco do Brasil, da quantia de R$ 6.827,82, que seria o valor restante dos proventos recebidos no dia 30/08/2010, conforme se verifica do documentos juntado às fl. 15.

Pretende assim o agravante a suspensão da decisão e o desbloqueio dos valores, sob o argumento de que a verba bloqueada é decorrente de proventos, logo, impenhorável por disposição de lei.

Em sede de agravo, a concessão de liminar deve ser deferida quando demonstrado pela parte a plausibilidade do direito alegado, bem como o perigo de dano irreparável ou de difícil reparação.

Passo então, à análise dos requisitos legais para a concessão da tutela de urgência.

Segundo estabelece o Código de Processo Civil o salário, seja qual for a nomenclatura a ele atribuída, é um bem absolutamente impenhorável, Vejamos os dispositivos que tratam sobre a questão:

“Art. 648. Não estão sujeitos à execução os bens que a lei considera impenhoráveis ou inalienáveis.

Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:

IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3o deste artigo; ...”

Nesse sentido, entendo que o agravante fez prova de que o valor bloqueado é decorrente de parte dos proventos recebidos a título de pensão como ex-governador do Estado, valor este bloqueado na conta-corrente onde recebe seus proventos. Logo, presente a plausibilidade da alegação.

Ademais, sobre a questão da impenhorabilidade de proventos, o colendo STJ assim se posiciona:

RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PENHORA DE CONTA-CORRENTE BANCÁRIA. PROVENTOS DE APOSENTADORIA. ILEGALIDADE MANIFESTA. DECADÊNCIA DO DIREITO À IMPETRAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA.

1. Cabível o mandado de segurança quando evidenciada a ilegalidade do ato judicial impugnado.
2. A impenhorabilidade de proventos é garantia assegurada pelo art. 649, inciso IV, do CPC.
3. Evidenciado o caráter repetitivo do ato coator, não há se cogitar da decadência do direito à impetração. Hipótese em que os efeitos da penhora se renovam mês a mês, a cada depósito de salário (e conseqüente bloqueio) realizado na conta bancária do devedor/impetrante.
4. Recurso ordinário provido.
(RMS 29.391/GO, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 20/05/2010, DJe 27/05/2010) PROCESSUAL CIVIL E LOCAÇÃO. ALEGADA VIOLAÇÃO AOS ARTS. 591, 646, 649, INCISO IV, E 655, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. INOCORRÊNCIA. VERBA ALIMENTAR ORIUNDA DE SALÁRIO E CRÉDITO DE FGTS DECORRENTE DE RESCISÃO CONTRATUAL.

1. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça somente tem admitido a penhora de verbas de natureza alimentar, bem como de valores decorrentes de FGTS, depositadas em conta-corrente, nas hipótese de execução de alimentos. Nas demais execuções, as referidas verbas estão resguardadas pela impenhorabilidade prevista no art. 649, inciso IV, do Código de Processo Civil.

2. Recurso especial desprovido.
(REsp 805.454/SP, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 04/12/2009, DJe 08/02/2010)
Vejamos também sobre a questão decisões dessa egrégia corte que respeitam o princípio da estrita legalidade, in verbis:

Agravo de instrumento. Penhora parcial do salário. Desconto em folha de pagamento.

A impenhorabilidade do salário do servidor é incerta no artigo 649, IV, do Código de Processo Civil, devendo ser respeitada, mesmo na hipótese de altos salários, porque presume-se, também, tenha depósito bancário ou outros bens em condições de sofrerem a constrição pela penhora.( Ag. Instrumento, N. 10000120030201828, Rel. Des. Kiyochi Mori, J. 14/08/2007)

Agravo de instrumento. Execução de título extrajudicial. Mensalidade escolar. Penhora parcial de salário. Desconto em folha de pagamento. Caráter alimentar. Impenhorabilidade absoluta.

A impenhorabilidade absoluta do salário decorre de lei, havendo, contudo, ressalva para o caso de o crédito exeqüendo possuir caráter alimentar. No caso do inc. IV do art. 649 do CPC, o legislador buscou preservar a própria manutenção do devedor, pois tornou impenhoráveis bens que detém natureza alimentar, não estando, portanto, sujeitos à execução. Nas demais hipóteses, o desconto em folha de pagamento só pode ocorrer com a autorização do devedor. (Ag. Instrumento, N. 10000120050147934, Rel. Des. Kiyochi Mori, J. 10/04/2007)
No mesmo sentido, os Tribunais pátrios:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENHORA SOBRE OS VENCIMENTOS DO DEVEDOR. IMPOSSIBILIDADE. 1. A regra inserta no art. 649, inc. IV, do CPC, que torna impenhorável os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões pecúlios e montepios, é destinada a garantir o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Permitir a penhora sobre os rendimentos mensais do agravante, ainda que de forma parcial, é violar o disposto na lei e, em segundo plano, é possível que se esteja ferindo o princípio da dignidade da pessoa humana. 2. Recurso provido. (TJMG – Processo n. 1.0647.05.053662, Relator Des. WAGNER WILSON, 15/04/2009)

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. SALÁRIO DO DEVEDOR. IMPENHORABILIDADE. Indevida penhora de percentual de depósitos em conta corrente, em que são creditados os salários. A impenhorabilidade de vencimentos é uma das garantias asseguradas pelo art. 649, IV do Código de Processo Civil. (TJMG – Processo n. 032404022771-6, Relator Des. JOSÉ FLÁVIO DE ALMEIDA 25/01/2010)
No que diz respeito ao requisito do perigo da demora, a própria natureza da verba discutida nos autos é capaz de demonstrar a sua presença, pois, se estamos diante de proventos, estamos então tratando de verba de caráter alimentar, cuja privação pode causar danos irreparáveis ao agravante.

Desta forma, defiro a liminar de suspensão da decisão agravada, e, por consequencia, determino a liberação imediata dos valores bloqueados na conta-corrente do agravante, os quais devem ser objeto de liberação pelo juízo a quo. Intime-se.
Ao agravado para, querendo, apresentar contrarrazões.
Solicite-se informações ao juízo da causa.
Porto Velho, 24 de setembro de 2010.
Desembargador Walter Waltenberg Silva Junior
Relator

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