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MPF obtém decisão para que Justiça Federal julgue disputas de posse em terras da União mesmo quando Incra não é parte
Sexta-feira, 09 Maio de 2025 - 09:04 | MPF

Em um desenvolvimento significativo para a questão agrária em Rondônia, uma decisão do Tribunal Regional da 1ª Região (TRF1), em recurso (agravo de instrumento) proposto pelo Ministério Público Federal (MPF), reforça a competência da Justiça Federal para julgar disputas possessórias entre particulares que ocorrem em terras públicas federais. O TRF1 suspendeu decisão da 5ª Vara Federal Ambiental e Agrária, que havia determinado o envio de um processo de reintegração de posse em terras públicas da União, movido por particulares, para a Justiça Estadual de Rondônia.
A decisão do Tribunal é importante por reafirmar que ações de reintegração de posse movidas por particulares, relativas a terras públicas federais, em muitos casos deferidas pela Justiça Estadual, devem ser julgadas pela Justiça Federal. De acordo com a decisão, a competência é federal mesmo quando o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) não atua como parte para justificar a competência derivada do MPF na defesa das terras públicas e do patrimônio público. No caso específico, o TRF1 decidiu que o processo deve permanecer suspenso até o julgamento do recurso proposto pelo MPF, que defende haver interesse federal no caso.
Além disso, o TRF1 entendeu que a causa possui relevância fundiária e social, exigindo atuação da Justiça Federal, já que as provas evidenciam a presença de interesse jurídico direto do Incra na demanda. Há procedimentos administrativos em tramitação no Incra para implementação de política pública federal de reforma agrária na área em disputa.
Os particulares alegam que vêm exercendo a posse pacífica do imóvel rural denominado “Fazenda Vale do Rio Madeira”, que totaliza 1.900 hectares, localizado na Gleba Capitão Sílvio, que é da União Federal, próximo ao quilômetro 188 da BR 364, que interliga Porto Velho (RO) a Rio Branco (AC). De acordo com os autores da ação, os lotes, localizados na “Região da Ponta do Abunã”, estariam sendo alvo de invasões praticadas por pessoas que se intitulam membros da Liga dos Camponeses Pobres (LCP).
A decisão do TRF1 estabelece que, mesmo que o Incra não atue diretamente no processo como parte, a competência para julgar a ação permanece na Justiça Federal. O MPF, autor do agravo de instrumento, argumentou que sua atuação na defesa do patrimônio público e dos princípios constitucionais da política de reforma agrária justifica a competência federal, mesmo que ocorra omissão do órgão público responsável direto, no caso o Incra.
Entenda o caso - Movida por particulares, a ação teve início na Justiça Estadual e foi remetida à Justiça Federal após o Incra informar que se tratava de área pública federal. A 5ª Vara Federal de Rondônia, no entanto, havia decidido devolver o caso à Justiça Estadual, argumentando que a competência federal se daria apenas com a presença de ente federal como parte e que disputas possessórias entre particulares poderiam ser julgadas na justiça comum, mesmo em terra pública federal.
O MPF interpôs o agravo de instrumento contra essa decisão, argumentando que ela era nula por não ter sido concedida ao MPF a oportunidade de se manifestar sobre o mérito após as partes, conforme previsto em lei. Além disso, o MPF sustentou que não existe posse de particulares sobre bens públicos, apenas mera detenção de natureza precária, o que impediria o ajuizamento de ações possessórias por particulares em terras da União. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reforça a impossibilidade de particulares possuírem bens públicos e, consequentemente, o direito à indenização por benfeitorias nesses casos.
O Incra já havia se manifestado nos autos, confirmando que a área é propriedade da União, pertencente à Gleba Capitão Sílvio, e que está em análise para regularização fundiária. O órgão também informou que os autores da ação, que alegam posse da “Fazenda Vale do Rio Madeira”, têm pedidos de regularização fundiária em tramitação, os quais foram suspensos pelo Incra em Rondônia até a conclusão do processo judicial.
A área é conhecida como Acampamento Roberto Pandolfi - Área do Kekão, sobre a qual já havia sido identificada a necessidade de cadastramento das famílias pelo Incra e a dificuldade encontrada com a Agência de Defesa Sanitária Agrosilvopastoril do Estado de Rondônia (Idaron) para cadastro sem documentos possessórios.
A decisão do TRF1, ao reconhecer a competência federal, impede que ordens possessórias irregulares sejam concedidas sobre terras da União, protegendo o patrimônio público federal e o direito das pessoas que buscam a reforma agrária e regularização fundiária.
Processo judicial nº 1002276-45.2025.4.01.0000