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Medicina Preditiva

Sábado, 07 Agosto de 2010 - 11:23 | Cândido Ocampo


Com a conclusão da primeira parte do “Projeto Genoma Humano”, fruto de estudos de cientistas de vários países, a ciência tem em mãos o mapa genético do ser humano. O famoso DNA, espécie de programação biológica que acompanha o indivíduo no passado, presente e futuro e possibilita a medicina realizar projeções antes inimagináveis. Já se disse que a carteira de identidade do ser humano no século 21 ainda vai ser a sua cartografia genética. Euforia retórica ou não, o certo é que a ciência médica com a evolução da biogenética possui, hoje, instrumentos tecnológicos que podem, com certo grau de precisão, identificar predisposições que o indivíduo humano tem em desenvolver ou não determinadas doenças. É o que se denomina “diagnóstico preditivo”, ou em outra categoria, “diagnóstico pré-sintomático”, esse muito mais preciso. Sem esquecer os inegáveis benefícios da medicina preditiva, não há como ser indiferente às questões de ordem ética e jurídica que esses novos tempos suscitam.



A primeira pergunta que vem à mente do médico é como proceder com o paciente diante de um diagnóstico de probabilidade, onde se identifica a possibilidade de o mesmo desenvolver ao longo de sua vida uma doença gravíssima. Tal revelação não anteciparia o estado psicopatológico do indivíduo, que poderá, em verdade, ser vítima de uma doença que jamais se manifestará? Noutro norte, surge a possibilidade da revelação levar o paciente a tomar medidas preventivas no sentido de evitar a manifestação da patologia. Qual conduta deve ser adotada? Quais as consequências éticas e jurídicas que podem ser suscitadas? O Código de Ética Médica no inciso V, do seu capítulo I, que trata dos princípios fundamentais, prescreve que “compete ao médico aprimorar continuamente seus conhecimentos e usar o melhor do progresso científico em benefício do paciente”.

O artigo 32 determina ser vedado ao médico “deixar de usar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento, cientificamente reconhecidos e a seu alcance, em favor do paciente”. Por sua vez, o artigo 34 veda ao médico “deixar de informar ao paciente o diagnóstico, o prognóstico, os riscos e os objetivos do tratamento, salvo quando a comunicação direta possa provocar-lhe dano, devendo, nesse caso, fazer a comunicação a seu representante legal”. No entanto, o que pode parecer uma solução, ou seja, a comunicação ao responsável legal pode ser apenas a transferência da mesma angústia a terceira pessoa que não o paciente, que pode ser tão vítima quanto aquele. A verdade é que os conceitos éticos da velha escola hipocrática, baseada na “ética das virtudes”, não nos dão respostas satisfatórias porque cunhados em outro contexto histórico, onde o diagnóstico era uma inspiração divina e a doença tratada como um castigo de Deus. Não se trata de tomar a decisão baseado apenas na prudência ou experiência empírica do profissional.

A nova ordem social e jurídica exige precisão científica (princípio da beneficência) e menor dano possível (princípio da não maleficência). E nesse contexto a biogenética, apesar dos avanços, não é infalível. Talvez a nova “ética dos princípios” desenvolvida pelos bioeticistas, ou a ainda mais recente corrente dos “antiprincipialistas”, que se baseia na qualidade moral, no cuidado solícito e na casuística, onde cada caso é um caso, podem nos oferecer respostas alentadoras que a vetusta ética hipocrática, prisioneira dos rigores da tradição e das influências religiosas, não nos oferece.

Cândido Ocampo, advogado atuante no ramo do Direito Médico.
candidoofernandes@bol.com.br

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